Projeto de Trabalho 2020-2022

Coordenação de Crianças e Adolescentes

Coordenadora: Aline Pinto da Silva – Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre (SBPdePA)
Coordenadora Suplente: Carmen Rosa Zelaya Pflucker – Sociedad Peruana de Psicoanálisis (SPP)
Colaboradoras:
Alicia Beatriz Lisondo – Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP)
Analía Wald – Asociación Psicoanalítica Argentina (APA)
Ana Rosa Chait Trachenberg – Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre (SBPdePA)
Claudia Bregazzi – Asociación Psicoanalítica de Buenos Aires (APdeBA)
Martha I. Jórdan – Sociedad Colombiana de Psicoanálisis (SOCOLPSI)
Martha Inés Mariela – Sociedad Freudiana de la Ciudad de México (SFCM)
Martha Perroni – Asociación Psicoanalítica del Uruguay (APU)
Valéria Silveira – Sociedade Psicanalítica de Pelotas (SPPel)

Nossa proposta de trabalho, além de ser um olhar conjunto para o futuro, é de dar continuidade ao que vem sendo realizado de forma muito consistente pelas diretorias da Fepal e ampliar nosso campo de atuação, levando em conta o momento que estamos vivendo.

A pandemia afetou a todos nós, de forma diferente, mas com mudanças importantes na economia, política, nas relações sociais e na prática psicanalítica. Escancarou e acentuou uma desigualdade social imensa. Milhares de bebês, crianças e adolescentes da América Latina vivem em situação de miséria, violência, racismo.

Concomitantemente, exigindo um trabalho psíquico, possibilitou que pudéssemos criar e experimentar formas de estarmos juntos que antes eram impensáveis, seja com nossos pacientes, nas nossas reuniões, ou no próprio Congresso da Fepal que foi realizado de forma online. Mesmo em isolamento, estamos em movimento. Talvez pudéssemos pensar que essa
experiência coletiva de ameaça, despertou e nos convocou a elaborar os medos e criarmos saídas. Aqui lembramos do conceito “Condenados a Investir” de Piera Aulagnier, condenados a metabolizar, processar e dar um destino, nem que seja o “desejo de não desejo”.

Na clínica, com a chegada da pandemia, fomos todos simultaneamente pegos de surpresa e arremessados ao atendimento on-line, antes de tudo pela necessidade de proteção à vida. Tornou-se a forma possível de estarmos com nossos pacientes. Muitos de nós já atendíamos adultos ou adolescentes nessa modalidade, em situações especiais. De toda forma, o
atendimento com crianças é algo inédito, portanto, cercado de muitas dúvidas, com muitas variáveis a serem equacionadas. O desafio passou a ser o de construir dentro desse novo campo, um espaço de cuidado, empatia, acolhimento, afeto e esperança. Construir um lugar analítico,
mais além do espaço físico, em que a função analítica fosse preservada. Hoje, com o passar do tempo, surgem novas questões que precisam ser pensadas, experiências riquíssimas que podem ser trocadas, transformadas em registros, em produções científicas.

Em meio a toda essa vivência que a pandemia está nos proporcionando e a apresentação do Manifesto Vidas Marcadas lançado pela comissão anterior, nos aliamos à diretoria de comunidade e cultura e perguntamos: O que é ser psicanalista de bebês, crianças e adolescentes hoje? O que buscamos? O que fazemos?

Enfrentamos um momento que nos leva a afinar nossa escuta analítica. Precisamos estar juntos para pensarmos, esclarecermos e nomearmos nossa comoção emocional, nos apoiarmos, descobrirmos estratégias que nos permitam continuar atendendo as necessidades da população. Por isso convocamos todas às sociedades a indicarem um representante da área de infância e adolescência para mantermos uma comunicação contínua abarcando e conhecendo o modo de trabalho de cada instituição, respeitando a pluralidade e diversidade dos marcos teóricos
clínicos e ações na comunidade e assim elaborarmos um fértil e criativo projeto. Dessa forma podemos avançar e pensarmos em diferentes tipos de abordagens que possam diminuir o sofrimento psíquico dos bebês, crianças, adolescentes, dos pais, das famílias da América Latina.

Algumas ideias nos ocorreram e como ponto de partida elegemos os aspectos criativos da vida cotidiana, do nosso trabalho, das nossas crianças e adolescentes.

Os distintos dispositivos de trabalho criados pelas últimas gestões da Comissão de N y A se focalizaram no trabalho com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade e desigualdade social. Deste modo, hierarquizaram o trabalho que múltiplos grupos de psicanalistas vêm realizando extramuros e de extensão da psicanálise nas urgências sociais, situações de catástrofe ou em interdisciplina. Se pode observar a criatividade posta em jogo pelos psicanalistas na criação de ditos dispositivos e nos novos modos de intervenção. Em 2020, a pandemia afetou a vida de todos e também o trabalho dos psicanalistas. Assim, nós analistas de crianças nos vimos convocados a criar novas formas, códigos e enquadres para aceder ao trabalho com nossos pacientes, implantando processos de criatividade máxima, impensados em outras circunstâncias. Por isso pensamos que a criatividade e os processos criativos são um eixo
transversal ordenador do trabalho recompilado pelas últimas gestões e que nos orienta no aprofundamento dos marcos que fundamentam as práticas dos psicanalistas de bebês, crianças e adolescentes na época atual. Assim, a criatividade manifestada pelos analistas tanto nos
consultórios como extramuros resulta um campo fértil para ampliar, a partir das práticas, os marcos conceituais teórico-clínicos.

O conceito de criatividade permite também vincular o potencial de desdobramento das subjetividades com os processos sociais nas culturas onde as crianças nascem e crescem.

A cultura não é uma série de conteúdos, mas sim uma matriz simbólica que não está desencarnada das condições históricas. O acento está posto em como se recepciona o que a cultura oferece, dizer de que maneira cada um incorpora o que já existe outorgando-lhe novos significados. Assim, a cultura é “algo vivo” cuja significação está dada pelo traço criador e criativo de cada ser humano, que lhe dá sua impronta singular. Os elementos culturais são o não-criado pelo próprio sujeito, o acervo cultural em e com a criança nasce. Em seu devido tempo, se encontra, descobre, co-cria na medida em que o espaço transicional possibilita seu
ingresso, transformando-se assim em próprio e pessoal. A relação com o mundo não obedece a uma sucessão linear de objetos senão a uma ramificação de experiências subjetivas. Sua manifestação mais clara é a capacidade de constituir um espaço potencial. Isso significa que os processos de apropriação criativa da vida cultural e da capacidade de produção simbólica das crianças e adolescentes requerem sempre um meio facilitador para ativar esse potencial. O meio facilitador refere-se a sustentações familiares, sociais, estatais e também, é claro, o trabalho dos psicanalistas.

Deste modo, a criatividade não se circunscreve a atividade artística o artesanal, mas sim a cotidianidade. Se valoriza o gesto criativo nosso de cada dia, nas práticas mais simples. Não é uma capacidade propriedade de alguns seres humanos, mas um potencial que, com o apoio adequado, se desenvolve desde o momento do nascimento.
“No momento em que a boca encontra o seio, ela encontra e absorve um primeiro gole do mundo. Afeto, sentido, cultura, estão co-presentes e são os responsáveis pelo gosto das primeiras gotas de leite”. (Aulagnier, 1975)

A modalidade específica da vida é a potencialidade. Viver em termos Winnicottianos não é mais do que criar um espaço de desenvolvimento de possibilidades.
Pensamos que o viver psicanalítico também pode carregar esse tom. É por isso que queremos nos centrar na criatividade dos próprios psicanalistas para construir dispositivos teóricos e clínicos e de ações sociais que favoreçam processos de transformação subjetiva. Esse trabalho pode enriquecer as práticas e corpo teórico da área de bebês, crianças e adolescentes, as famílias, bem como, de toda a psicanálise.

A pandemia já produz seus efeitos e não sabemos o que está por vir. Portanto, nossa ideia é de nos mantermos atentos às incertezas que esse futuro nos reserva. Isso implica em uma tarefa dinâmica, de estruturação progressiva de abordagens e planejamento.

Por isso decidimos organizar o trabalho em modo de perguntas:

Eixos de trabalho

  1. Processos criativos no trabalho extramuros: é possível encontrar algum fio condutor nas novas experiências? Qual é o potencial que se coloca em jogo a partir das intervenções dos psicanalistas? Processos criativos na interdisciplinaridade: é possível a fertilização recíproca e a construção de uma linguagem comum que nos permita integrar os coletivos trabalhos no campo da saúde mental e das políticas públicas? Processos criativos no trabalho em dispositivos ampliados orientados a prevenção: mães, pais, famílias, educadores.
  2. Processos criativos no trabalho na pandemia: Como vão se posicionando os analistas frente a nova realidade? Como e porque seguimos trabalhando na virtualidade? O que nos ensina o trabalho através dos dispositivos sobre a clínica psicanalítica? Diferenças no trabalho com crianças com transtornos graves. Dispositivos e enquadres
    novos. Que aspectos da prática e da teoria foram modificados?
  3. Processos criativos na experiência cultural: Como nos posicionamos como analistas frente a crise civilizatória? Qual é a incidência em nossa prática das transformações antropológicas contemporâneas? Como nos deixamos interpelar pelas diversidades culturais, familiares, sexuais e de gênero que caracterizam o mundo contemporâneo? Como incorporamos em nossos marcos o papel do Outro social nos processos de subjetivação? Podemos nós, como psicanalistas de crianças, facilitar as maneiras que as crianças podem aumentar a inclusão e enriquecer a experiência cultural? Qual é o papel dos analistas como comunicadores sociais se nosso trabalho hierarquiza a singularidade?
  4. Processos criativos no trabalho com crianças e adolescentes com transtornos graves na subjetivação: De que modo o trabalho com pacientes graves tem enriquecido os marcos conceituais, os enquadres e dispositivos? Qual é o potencial de trabalho com mediadores terapêuticos? Constitui um antecedente para o trabalho na pandemia? É possível sustentar o trabalho através das telas com crianças com transtornos graves.

Dispositivos de trabalho

Esta gestão pretende dar continuidade e aprofundar alguns projetos criados e desenvolvidos em gestões anteriores, assim como explorar novos dispositivos de trabalho.

  1. O Projeto Diarios de la Calle foi criado em 2016, com o objetivo divulgar no canal web da Comissão de crianças e adolescentes de Fepal, experiências de psicanalistas latino-americanos realizadas junto a comunidades vulneráveis. Neste momento, conta com um número considerável de vídeos que visibilizam o trabalho extramuros realizados
    em diversas regiões da América Latina. Entretanto, devido a pandemia o projeto vai ser adaptado para encontros através da plataforma Zoom, com dois convidados e um mediador. Os convidados podem incorporar vídeos ou fotografias que ilustram suas atividades. Estes encontros se realizarão a cada dois meses, serão gravados e publicados no Facebook de Diarios de la Calle, estimulando a serem visitados e comentados. É de particular interesse a difusão dos vídeos em cada sociedade, sobretudo na área de infância e adolescência, através dos delegados. Assim como fomentar suas participações através de iniciativas próprias que reflitam seus interesses e necessidades. Consideramos de suma importância encontrar fios condutores, hierarquizando os processos criativos implicados nessas experiências para enriquecer o olhar e a formação dos psicanalistas de bebês, crianças e adolescentes.
  2. O projeto Semear foi idealizado na gestão 2016-2018 e iniciado na gestão 2018-2020 da Comissão de Infância e Adolescência FEPAL. Nesta gestão 2020-2022, buscamos ampliar o Semear, tendo em vista seu potencial como ponte de contato, troca, intercâmbio entre a área de bebês, infância e adolescência e a comunidade geral.
    O objetivo do projeto é que através de espaços virtuais possamos abordar temas que promovam um debate de fundo em relação à infância, bebês e adolescência, a partir do campo psicanalítico, para a comunidade, e sob este campo, fazer uma ponte, uma zona de encontro e comunicação. Para tal, contamos com dois espaços virtuais atualmente – página Semillar/Semear no Facebook e site FEPAL, além da ampla divulgação do material produzido pelo projeto nas redes sociais FEPAL e OCAL. Nesta gestão temos a ideia também de produzir também podcasts, com o objetivo de termos maior alcance entre a comunidade geral.
    Pensamos que a psicanálise, na necessidade de preservar seu rigor, foi ficando em uma zona de “difícil acesso” para a comunidade: uma área enigmática e muitas vezes seletiva. Por isso consideramos válido o esforço de trabalhar as ideias psicanalíticas em linguagem mais simples. Pretendemos repensar os aspectos complexos que envolvem a compreensão psicanalítica, sem, no entanto, simplificá-los ao ponto de parecerem superficiais. Diante do grande aumento da utilização das redes sociais em virtude da pandemia causada pelo COVID-19, nos parece ainda mais pertinente a manutenção e ampliação do projeto. O espaço Semear é uma importante via para que os psicanalistas de bebês, crianças e adolescentes da América Latina possam se colocar em contato com a comunidade a partir de textos, vídeos, manifestações artísticas (como música, poesia entre outras) que promovam um pensar sobre essas áreas do desenvolvimento, visando cuidados com o sofrimento psíquico da nossa população.
    A ideia é abordar questões gerais, cotidianas que preocupam ou inquietam a todos aqueles que, por diferentes razões e de diferentes lugares, estão em contato ou se ocupam com a criação, cuidados, ou educação de bebês, crianças e adolescentes. Este espaço será receptivo a todos as publicações que representam uma reflexão séria, acolhendo e respeitando a pluralidade dos marcos teóricos. É parte do objetivo expandir e nutrir com outras disciplinas que nos ajudarão a ampliar as perspectivas do pensar a infância, os bebês e a adolescência.
    O Semear seguirá tendo uma equipe composta por analistas em formação da América Latina. Além disso, contará com aporte de todas as integrantes da comissão de infância e adolescência. Esta ampliação objetiva que as publicações contemplem os mais diversos aspectos e questões que envolvem o desenvolvimento do ser humano desde os anos iniciais da vida até a adolescência.
  3. Os Encontros Inter-regionais vêm sendo desenvolvidos através de sucessivas gestões. São três atividades científicas anuais organizadas conjuntamente com uma Sociedade componente e Fepal. Promovem o diálogo entre diferentes regiões geográficas da psicanálise na América Latina, favorecendo o intercâmbio de experiências clínicas e conceituais, além de difundir a psicanálise na região onde ocorre o Inter-regional. Os encontros serão reformulados de acordo com as condições atuais.
  4. Simpósio de Crianças e Adolescentes , vêm sendo realizados desde 2018. Nesta gestão, daremos prioridade aos eixos de trabalho propostos neste projeto para serem debatidos e aprofundados durante o simpósio a ser realizado no Congresso da FEPAL de 2022.
  5. Comissões de trabalho e grupos de estudos. Realizam estudos sobre temas eleitos pelo grupo, constituído por colegas de diferentes regiões e sociedades, com apoio da Diretoria de Infância e Adolescência da FEPAL. Temos atualmente um grupo que se chama Alô Bebê e uma comissão que estuda a primeira infância e as patologias precoces.
  6. Reuniões a cada dois meses com os delegados de infância e adolescência das sociedades com o intuito de criar laços mais estreitos com a FEPAL. Que estes possam ser a ponte entre a Comissão de I e A da FEPAL com os membros de suas sociedades e dessa forma divulgar e fomentar a participação nos projetos propostos.
  7. Criação de Fóruns de discussão apoiados em nossos eixos de trabalho. Se constituirá um foro de discussão assincrônico para cada um dos eixos propostos. Cada fórum será um espaço de troca entre analistas de distintas regiões.
  8. Diretoria de Comunidade e Cultura:
    Desenvolver em parceria com a diretoria de Comunidade e Cultura projetos que promovam intercâmbios, diálogo entre colegas que desenvolvem trabalhos na comunidade com bebês, crianças e adolescentes. Traçar caminhos no mapeamento já existente, assim como agregar e incentivar a extensão da clínica, modalidades de intervenções, aprofundar a reflexão teórica clínica.
  9. Na formação ampliada , contribuir com as sociedades para o desenvolvimento da área de bebês, crianças e adolescentes. O estudo dessas etapas do desenvolvimento em sua potência máxima, enriquece a formação como um todo.
  10. Criação de grupos de supervisão da infância e adolescência.

Comissão de Infância e Adolescência:
Aline Pinto e Carmen Zelaya
Alicia Beatriz Lisondo, Analía Wald, Ana Rosa Trachtenberg, Claudia Bregazzi, Martha I. Jórdan, Martha Inés Mariela, Martha Perroni, Valéria Silveira.

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